domingo, 29 de setembro de 2013

pensamento e ato

Como é aconchegante a ausência da ausência.
O preenchimento do hiato.
A paz em sua essência.
O afetuoso encontro de pensamento e ato.

sábado, 28 de setembro de 2013

respeitar é

Respeito é bom, eu aposto.
É saber peitar o sujeito sem predicados, sem machucá-lo.
Respeito é até abrir mão do que eu gosto.
É também saber falar mansinho, apesar do falo.

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

tribos

Em tempos globais, as aldeias substituem as ideias, instituem tribos.
Tribo dos sempre felizes e a dos sempre infelizes.
Tribo dos reprimidos e a dos espremidos.
Tribo dos emblemáticos, bem como a dos problemáticos.
Tribo das que têm muitos fundos e a dos que não têm fundo algum.

Nas salas de aulas, a divisão é bastante perceptível: os das primeiras cadeiras, os das últimas e o bololô do meio.
O mesmo acontece nas empresas: os que sabem das coisas, os que querem saber, os puxa-sacos, os malas, os que pouca gente vê, os que pouco veem.
As inscrições estão sempre abertas, mas algumas tribos fecham bem as portas.

domingo, 22 de setembro de 2013

avenida central

Longe de ocultar, ostento meus remendos
Ausculto os meus medos, ao menos os mais sedutores
Eles são meus mais fiéis tradutores
Lambo as feridas doces, para que não cicatrizem
Se preciso fosse, eu renasceria
Mas seria tão bom quanto é?
As pequenas mortes ressuscitam-me
Incitam-me à vida sem vendas
No mais, só lendas pedindo para que sejam lidas
Ávidas por se converterem em vidas
Largas avenidas por onde transite o acontecer

dez necessário

Sou o tormento que rouba tua insônia
A menta que enfeitiça teu paladar
Sou a tinta que tatua teus segredos
O que nada guardou e por isso tem tanto para dar

Sou a vela que ilumina e engole o vento
O penúltimo motivo para acreditar
Sou o grito interrompido pelo próprio grito
A areia que decide entre a praia e o mar

sábado, 21 de setembro de 2013

gênesis

Não se preocupe. Há beleza por toda parte. Se estrelas brilham lá em cima,
algo mais radiante pulsa acima e abaixo delas. Atrás dos espelhos, não existem
apenas imagens. Nascem florestas invisíveis todos os dias, com criaturas límpidas
e rochas que sorriem. Perceba as pegadas da magia primitiva nas paredes da memória mais profunda. Houve tempos em que não havia tempo, nem templos.
Deus não precisava de disfarces, de mil faces, para ser visto. Manhãs e noites se confundiam nos acordes magníficos da canção da eternidade. Tudo foi possível e assim será.

desajustado

Sou um desajustado.
Não me ajusto à injustiça a céu aberto.
Não me ajusto à justiça seletiva.
Não me ajusto aos corações desertos.
Não me ajusto às certezas definitivas.


Sou mesmo um desajustado.
Não me ajusto às mentes estreitas.
Não me ajusto às ações impiedosas.
Não me ajusto ao predador sempre à espreita.
Não me ajusto à verdade mentirosa.

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

alto

Quando penso alto, escrevo amiúde. 
Não no volume, mas na altitude.
Longe da águia, mas sempre com dor.
Exatamente como o céu, que só muda de cor.

preguiça inteligente

Viva a preguiça inteligente, 
que aquieta o querer.
O dolce far niente,
que permite apenas ser.

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

fruto

Que o amor seja entregue

como a terra faz com o fruto


Que aquele que o pegue


dele tenha cuidado a cada minuto

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

fogo fátuo

A beleza pode não estar na cara. Às vezes, ela se espalha generosamente por todo o corpo da mente. Assim sendo, com a chama se renovando e reacendendo, o fogo não será de palha.

a cura

Que todos conheçam esses silêncios quietos
Esses sons sonolentos espertos
Que espetam as distâncias,
tornando-as tão próximas feito imãs.

Que todos procurem e ao achar se curem
Que não prendam, apenas segurem
Que se surpreendam com coisas banais
Que jamais se contentem em ser somente normais.

terça-feira, 17 de setembro de 2013

uns e outros

Mesmo que você se apaixone pelo cactus,

não é preciso ficar verde, beber pouca água


e morar no deserto.

causa e consequência

Uma coisa puxa outra
Bocejo, gracejo, beijo

Uma coisa puxa outra
Rasteira, coceira, besteira

Uma coisa puxa outra
Gentileza, sutileza, franqueza

segunda-feira, 16 de setembro de 2013

fartura e escassez

Amo quando rio
e quando choro
Amo o calor e o frio
de onde moro

Passo pela fartura,
enquanto dura
Passo pela escassez,
com altivez

Afago o bem
que há no meu peito
E se não afogo o mal,
é porque não tem jeito

no mundo da lua

Quero morar na Lua.
Lá não tem que comprar ingresso,
não tem cinema e nem pipoca.
Quero morar na Lua.
Lá não há congestionamentos,
nem buzinas, nem mar.
Quero morar na Lua.
Lá não há impostos,
nem leões, nem florestas.
Quero morar na Lua.
Lá não há assaltos à mão armada,
nem armas, nem mãos.
Quero morar na Lua.
Lá não tem Congresso,
nem corrupção, nem futebol.
Quero morar na Lua.
Lá não há filas,
nem compromissos, nem gente.
Quero morar na Lua.
Lá não tem pressão,
nem opressores, nem oprimidos.

Haverá comprimidos?

sábado, 14 de setembro de 2013

o ditado, sem ditador

Procura-se pela verdade.
E ela está na cara, mas não é para a cara que se olha.
A verdade está mais cara, poucos podem comprá-la.
A verdade está mais rara, quase ninguém consegue encontrá-la.
Estaria na sentença?
Cada cabeça, uma sentença, diz o ditado.
Melhor assim, cada qual com a sua, sem desavença.

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

igual a você

Ser igual ou ser diferente?
Para alguns, faz diferença ser diferente.
Mas se todos pensarem assim, serão todos iguais.
E o que será mesmo ser igual?
Esconder as diferenças ou ser indiferente a elas são alternativas à mão.
Mas há ainda aqueles que se vangloriam ao andar na "contramão", talvez por por serem discípulos da rebeldia de calças curtas.
Esses são diferentes genéricos, de ara
que, seu gozo é imitar as pseudo proezas alheias, com o objetivo de serem iguais aos diferentes.
Por mais que a suposta igualdade possibilite instantâneas inclusões nas tribos, não haverá lugar para todos nos estribos.
Originais somos todos, quando temos a coragem de ser o que somos.
Mas basta um leve descuido e sumimos nos oceanos de iguais e seus manuais de mesmices.
Fazer-se de igual, de vez em quando, permite um confortável anonimato.
Mas em nome de nada mate o que é mais precioso em seu ser: o seu jeito.
No peito e na raça, no seu cantinho ou na praça, seja sempre igual...a você.

na geral

O espetáculo da vida é para ser assistido de pé e não em camarote.
Ele inclui, necessariamente, suores, odores, mandingas.
Excesso de assepsia inibe a interação plena, afugenta os espasmos da paixão.
É como a sardinha frita, o bolinho de bacalhau e o mate gelado na praia.
A origem, o processo de criação são desconhecidos, ao contrário do sabor que é, convenhamos e confessemos, incomparável.
O grande barato da existência não é apenas barato, mas de graça.
Aliás, a graça é essencial para curtir as coisas simples e magníficas.
Os "vip's" não se misturam e é exatamente a mistura o segredo da magia.

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

misto quente

Gosto de pessoas mistas. 
Otimistas por opção e realistas, sem opressão ao direito de sonhar.
Gosto de pessoas quentes.

Eloquentes com simancol, daquelas que dialogam com a Lua, sem serem lunáticas.

terça-feira, 10 de setembro de 2013

belezas sucessivas

Li um artigo sobre a limitação temporal da beleza feminina. Aos trinta e cinco anos,
a sedução outrora natural daria lugar a cosméticos e outros apetrechos que "esconderiam" as imperfeições. Simpatia e charme, por exemplo, seriam substitutivos para a exuberância física que, após três décadas e meia, simplesmente fugiriam do corpo da mulher. 
Engraçado ler isso, pois a minha concepção de beleza é bastante diferente. Não acredito que mulher alguma precise de paliativos químicos para manter-se atraente, desejável. Ao contrário, o tempo ensina ao corpo muito mais do que truques coreográficos. Eu respeito e aprecio os registros biográficos na pele feminina. Não os considero depreciativos ou atemorizantes. Antes disso, são como traços intuitivos de um pintor genial, que sabe e deseja que a tinta amolde-se ao passar dos anos e garanta à obra belezas sucessivas e não a preservação de um ideal utópico que a aprisionaria, apequenando o que não tem limites nem no tempo e muito menos na imaginação.

domingo, 8 de setembro de 2013

fatias de tempo

A vida falando pelos cotovelos 
A tarde dando com a língua nos dentes
Sonhos que não pesam, como pesadelos
Paz e alegria se amando estridentes

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

estelar

Diga-me uma coisa simples, simplesmente bela
Que produza em meus olhos um clarão estelar
Alguma palavra que salte da tela 
Que faça uma lágrima distraída se estatelar

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

que seja

Insuficiente a cereja
Se tiver que ser, que plenamente seja
Aprecio o cio da criatividade
Tudo que é, por ser de verdade

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

rachadura

A rachadura no sino. E ele chama, chama, vibra, vibra
A rachadura no tempo. E ele chama, chama, passa, passa
A rachadura na palavra. E ela chama, chama, vibra, vibra
A rachadura na terra. E ela chama, chama, passa, passa
A rachadura é vibrante. A vida é chama

A vida dura e a rachadura jura que passa.

domingo, 1 de setembro de 2013

solo dos anjos

Não é preciso blindar a alma.
Para que colocar cerca eletrificada em torno dos sentimentos?
Pensamentos não podem ser roubados, por exemplo. 

Por outro lado, é possível tomar exemplos por empréstimo. 
Mas sem garantia. 
O melhor da vida não se vende, é fiado. 
O medo excessivo é afiado e corta asas. 
Sem elas, o voo é no solo, onde não há estrelas nem solo de anjos para escutar.

nem todo dia é véspera

Ah! O encantamento das vésperas, das abençoadas esperas, com sabor de peras
maduras, à beira das mãos. Quem sabe quanto dura esse percurso entre o hoje,
tão curto e tão longo, e o amanhã, que boia nas nuvens espessas das cogitações? 
Vésperas são plenas, mas não são planas. É da índole delas as escarpas, os degraus
íngremes, a montanha russa. Vésperas brincam com os relógios, fazendo com que quase adormeçam e com a lógica, até torná-la travessa e avessa aos seus legados.

Há véspera tão encantadora que quase rouba a cena do dia seguinte. E olha que nem todo dia é véspera.