quarta-feira, 29 de junho de 2011

nudez

Gosto da nudez dos gestos,
sem retoque ou disfarce
Gosto da simplicidade do sorriso,
compreendido em qualquer idioma
Gosto dos olhares frontais,
que se tocam face a face
Gosto do corpo impreciso,
em que a verdade é o melhor sintoma


sábado, 25 de junho de 2011

sinais

Ponto para o inesperado, que nunca é combinado
Ponto para a nova oração, que não passa de outro vagão
Ponto para pegar o transporte, desde que se tenha sorte
Ponto de umbanda, Oxalá é quem manda
Ponto de encontro, onde o destino fica pronto
Ponto da cirurgia, fechando o que se abria
Ponto eletrônico, para o esquecimento afônico
Ponto de referência, tornando diferente o que se iguala na aparência
Ponto de exclamação, para mudar toda a direção!

quarta-feira, 22 de junho de 2011

esses

Saciamos a fome com fome
Somos, apesar de tudo que some
Seviciar a sede com saliva
Se viciar na vida sempre viva

segunda-feira, 20 de junho de 2011

A história de nós dois

Não sei se alguma coisa foi esquecida ou ficou guardada por aí
Talvez uma ou outra palavra tenha tropeçado nos lábios de cada vida que vivi
Foram tantas luas em nossos sonhos, mas devem ter sobrado algumas para depois
Como conchas que a areia encobre para proteger e o mar descobre para entregar a nós dois
As frases mais lindas adormecidas em redes, que pescaram as intenções mais sinceras
As tensões...queríamos que fossem eternamente meras
Aquela música ainda se mistura ao cheiro de café e maresia
O delírio de corpos estacionados ao léu, embaixo de todo aquele céu, onde a noite se escondia
Os olhares em rima, obra prima do acaso, se nele acreditarmos...mas tanto faz
O azul em tantas coisas, o verde em duas delas e o branco da tua paz 
Pegadas tão afins que nos fizeram desacreditar no fim
E onde ele termina? Se puder, conta para mim.

sexta-feira, 17 de junho de 2011

iniciação

É possível abrir a porta, romper o nó - da gravata, da garganta,
retirar o pó da ousadia, iluminar a luz de cada dia, ser inteiro sendo
só.
Compreender o canto dos pássaros, o vai-e-vem das formigas,
os sussurros da madrugada. Decifrar os desvãos dos olhares
anônimos, os desejos dos mercadores afônicos, o que se esconde
em segredos lacônicos.
Enviar respostas ao vento, amotinar-se contra o tédio e descobrir
o mais eficaz remédio, que jamais estará à venda. A essência da vida
é algo que se desvenda, com muita paciência e com certa penitência,
que precede a liberdade.
É preciso que se aprenda antes mesmo da escola que tolerância não é esmola.
Urge que se escolha o final de cada caminho e que se escreva em
pergaminho o que se quer iniciar.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

amor heterodoxo

Amo simplesmente
Por assim ser, amo gente, amando urgentemente
Amo sem explicar
Pois amor não cabe em tese, amor é ascese
Amo com contradições
Sem pretensões divinas, só endeusando o amor
Amo sem economia
Não guardo para mim o amor.



quarta-feira, 15 de junho de 2011

A2

Muito criativo o vídeo sobre o dia dos namorados, feito pela Vivo.
A partir da emblemática canção do Renato Russo, homenageou
todos os casais de namorados, que se ligam por conformidades e
desconformidades, por sutis (jamais hostis) diferenças, sem ofensas
à singularidade, que pluraliza o contato, enriquecendo as trocas, ao
invés de confinar individualidades em tocas.
Eduardei-me, ao sorrir para os trejeitos dos jovens atores, imensamente
espontâneos na encarnação dos personagens. Comoniquei-me com todos
os abraços, beijos e juras de amor gravados no corpo, no rosto e na memória
da humanidade.
Peças de um quebracabeça encaixam-se por serem desiguais (e somente
por isso). Salve, salve a alteridade. Salvem-me da austeridade tacanha, da
incapacidade tamanha de encantar-me com o que resplandesce no olhar do
outro, em todas as peculiaridades que o fazem ser o que é, oportunizando
descobertas, mancadas certas e certezas desertas, como devem ser.



quinta-feira, 9 de junho de 2011

movimento

Não se acomode, incomode-se com a inércia.
Móveis imóveis, decorações que sabe de cor.
É possível e preciso fazer melhor.
Emprego que te prende, como um prego.
Relacionamentos estáticos, ego cego.
Misture ingredientes, mude o tempero.
Experimente novas cores.
Desacredite nos censores.



quarta-feira, 8 de junho de 2011

duas metades

Que saudade da saudade que já sentimos,
que se esvai à medida em que partimos...
Para onde vai essa saudade?
Nuvens com desenhos engraçados,
chuva com pingos apressados,
palavras que saem de verdade.
Árvores e paredes tatuadas com inocência,
desejo que busca mais que a aparência,
metade que reconhece a metade.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

ao céu

Preciso devolver ao céu as estrelas que ele me emprestou
Assim que anoitecer, deixarei que elas saiam de meus versos
Eram elas que iluminavam minhas palavras, naqueles poemas
A onda, a brisa, a nuvem, a lágrima e o sorriso não se repetem
Temo que poucos tenham percebido suas ausências
Talvez pelo hábito de olhar o todo, sem tropeçar nos detalhes
Seja como for, de agora em diante, haverá mais luz lá em cima
E aqui permanecerão comigo o motivo e a saudade de cada uma delas


domingo, 5 de junho de 2011

dois atos

Primeiro ato

Gritei tanto que não fui ouvido. Corri demais e permaneci onde estava.
Quis tão afoitamente que o desejo assustou-se. Persegui o tempo, soprei
a ventania, desprezei a cautela, caí da cama. Achei que perderia e a perda
já estava achada.

Segundo ato


Fui ouvido no silêncio. A quietude levou-me mais longe.
O desejo desejou-me, sem instigar minha resistência. Fiz as pazes com os
segundos, abdicando de ser sempre o primeiro, aventei novas possibilidades,
apaixonei-me pela calma, caí na cama. Achei-me na perda, perdendo o medo
de me perder.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

um sinal

Nunca mais é tempo demais
É dezembro toda hora
Todo o futuro agora
São manhãs que se repetem
Cartas devolvidas
Vidas mal resolvidas
Porta fechada sem fechadura
A arma mais dura que mata o talvez
Sinal muito envergonhado
Sonho desacordado
Calafrio no verão
Rasteira na lembrança
Esperança na gaveta
nunca mais...



divisão de classes

Nerds e populares são frutos dos respectivos lares.
Aprendem cedo que lugar ocupar, mas não sabem a quem culpar.
Uns sentam bem na frente, embora sejam excluídos.
Outros preferem as últimas cadeiras e acreditam que passam todos pra trás.
Nerds são bons de nota, mas não são notados.
Populares são bons de bola, mas se embolam.
Nerds não precisam de cola para passar.
Populares passam pela escola para colar.
Nerds se escondem na biblioteca.
Populares se escondem na bicicleta.
Nerds não se acham os melhores.
Populares seriam melhores, caso se achassem.
Para os populares, nerds são peões e serão comidos.
Para os nerds, populares são leões que só têm rugidos.
Populares vivem rodeados por damas.
Mas os nerds é que entendem de xadrez.



quinta-feira, 2 de junho de 2011

céu da boca

O meu lar não tem lareira
Mas creia, sequer caberia
E a gente ria dessa gente tão fria
E olha que frio não faz lá em casa
E se calor fizer, nós deitamos no rio
Nos deleitamos com a neve que não há
Tão fugaz será o inverno naquela moradia
Um dia, mais breve que pensas, desatamos o nó
Já que moramos só nós, repartimos lençóis, repentinos fatores
que alteram o produto, em meio a tanta desordem, a todos acordem
Pois quando a noite vier, seremos dois sóis, no céu da boca da própria noite

errático

De mim, vertem sonhos. E me divertem, com toda a sua irreverência.
Tudo é possível quando a imaginação se liberta, correndo de pés
descalços, com o corpo todo suado de satisfação.
É com esses sonhos que me visto, pouco me importando se estou na
moda. Não me incomoda a nudez do olhar crítico.
Meus fantasmas fazem poemas, andam de mãos dadas, saboreiam
o vento da madrugada. Eles buscam tanto ar, que parecem padecer
de asma, mas é o resultado de tanto querer. São erráticos como eu,
por isso erramos, berramos, beiramos a loucura no frenesi da busca.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

de trás pra frente

A distância aumentou quando me aproximei dela.
Falávamos um do outro, não um para o outro.
Não nos víamos mais, a cegueira encobriu o sentimento,
como fumaça densa que esconde toda a paisagem.
Havia palavras sobre o chão, nas quais pisamos sem perceber.
A mesa estava vazia de apetites, desapareceram a fome e a sede de amar.
Apagamos nossa história e pagamos o preço dessa amnésia.
A porta aberta permitiu que o fascínio saísse e que a gente se descobrisse
e o frio entrou.
Uma pergunta sem resposta e a brincadeira termina do jeito que a gente não gosta.