domingo, 29 de dezembro de 2013

o interior da capital

E me deixei ao vento feroz, para que tudo aquilo que não tivesse ao menos um quilo de talvez
fosse levado para não sei onde.
E me entreguei aos labirintos, para esquecer todas as saídas
conhecidas, onde o nada se esconde.
E me fartei de jejuns, para provar o néctar do desejo original.

E me afastei dos comuns, para conhecer o interior da loucura capital.

desejo aos desejantes

Que haja flores, por onde fores. 
Que haja amores, onde mores.
Que haja cores e que tu decores os mistérios da vida,
para que seja mister teu encantamento.
Que cada momento que chegue aconchegue teus
propósitos e, de propósito, divirta teu rosto com
o gosto das mais deliciosas descobertas.
Que tua alma esteja aberta, pois a magia sempre acerta
o alvo desejante.
Que o melhor da festa seja a cada instante.
Feliz 2014!!!!

sábado, 28 de dezembro de 2013

a melhor viagem

O melhor da viagem, mais do que a chegada, é o caminho.


E a melhor viagem, que deixa a alma aconchegada, é a


partir do carinho.

otimismo

Há em mim um otimismo bobo, completamente desprovido de provas,
puro vapor. Ele vai por aí distribuindo sorrisos, até para quem não sorri.
Sorry, meu otimismo nem sempre usa óculos e, por isso, às vezes tropeça
numa pedrinha desavisada. Rala os cotovelos, justamente por onde fala,
mas nem assim ele deixa de insistir.

Otimismo teimoso, resiste aos fatos. Com arte e sem artefatos, respira fundo
e retoma o texto, sem pular uma só palavra e mantendo contato com a platéia.
E mesmo que ela seja atéia, ele relata tanto milagre, que chega a dar vontade
de ficar bem juntinho dele.

arqui tetos

Minhas ambições são mudas que emitem sons. Pedidos quase perdidos,
resgatados pelo grande arquiteto. Sonhos de olhos arregalados, que se
espalham por todos os lados, ignorando o exceto.

reinventando a roda

Bem que podíamos reinventar a roda. Ela andaria somente para a frente, passando por cima de pedras e de tolices. Escalaria montanhas de dúvidas, preservando-as, por amor
ao esporte. Anfíbia, seria capaz de surfar altas ondas e retornar à terra firme, sem morrer na praia e sem fugir da raia.
E nada de registrar patente, pois a nova roda, de tão potente, pertenceria a todo mundo
que nela se equilibrasse.

sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

a arte da vida

Dizem que a vida é a arte do possível. Sei lá. Tenho suficiente apreço pela vida para evitar afirmações tão dúbias. Entendo por possível o limite conhecido, a fronteira com o insondável, o último passo até chegar à porta que não se consegue abrir, a escuridão que
se crê invencível.
A vida é arte. Só isso. Com seus traços geniais, criando cores e formas inconcebíveis, traduzindo o que nem é dito, redefinindo o infinito, misturando incompatibilidades, a ponto de tonteá-las, variando temperaturas anarquicamente, propondo a dança das cadeiras com a teoria e a prática. Quem permanecerá de pé? O coração, que não é bobo, prefere outra brincadeira e sai, pé ante pé, em busca do rio que não dê pé, para nele mergulhar depressa. Afinal, sem essa de ficar torrando à toa, tornando-se trapo, para que o rato roa.
Talvez possamos dizer que a arte dá vida ao impossível. 

Se assim for, vivamos com arte, seja lá como for.
E, cada pra nós, aí fica muito mais divertido.

quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

bocaboca

Bater boca?
Só se for uma na outra.
Com a suavidade das asas da ave no vento
e com a voracidade dela, quando mergulha
no mar, em busca de alimento.

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

as rosas e os espinhos

"A rosa apaixonou-se pelo cactus, pois compreendia seus espinhos".
Compreender espinhos é o exercício mais sublime para todos que
desejam o melhor desejo. 
Compreender espinhos é uma boa síntese para o significado do Natal,
pois o ato de nascer traz consigo estranhamentos e desconfortos que

só podem ser superados com a prática suave do acolhimento, da inclusão,
da aceitação fraterna.
A rosa não se espanta com os espinhos do cactus, pois reconhece neles a
proteção e não a iminência da dor.
Espinhos e rosas aprenderam a conviver em paz, sem disputas territoriais,
nem comparações maliciosas.
As rosas não se vangloriam, diante dos espinhos, da beleza de suas cores, da
suavidade de suas pétalas, da sedução de seus aromas.
Por isso, elas se tornam mais belas, suaves e sedutoras.
E os espinhos cumprem seu papel dedicadamente, sem um único arranhão.

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

loucuras paralelas

Loucuras paralelas, para lê-las com os olhos fechados, pois as letras estão escritas dentro da gente. Loucuras gêmeas, que gemem da mais louca alegria. Loucura curativa, que estanca o que angustia. Loucura companheira, que da solidão só mantem o sol. Loucura que é mãe e pai da mais iluminada (com)paixão.

abracadabra

Ano feliz, de novo!
Sim, 2013 (que sequer fechou suas portas, ainda) deixará muitas lembranças.
De suas mãos, vieram dádivas, ávidas, cheias de vida. Dúvidas foram suturadas,

sem que outras fossem inibidas. Dívidas só de gratidão, sem promissórias nem
promessas, do tipo "aqui se diz e aqui se faz".
Dois mil e treze ensinou-me muitas coisas, abriu minha temporada de reflexões
mais apuradas, inflacionou o mercado de esperanças, aquietou algumas tolices.
Um ano e tanto, tântrico, mântrico. Ora paciente, como a arte do tricô. Ora intuitivo,
como as cartas do tarô. Sinuoso, mas apontando permanentemente para a frente,
para o novo. Colocando ovos a serem chocados aos poucos, a fim de evitar choques desnecessários. Tornou o necessário prazeroso, amadurecendo o prazer, de modo a ser colhido e não encolhido ou engolido pela ansiedade voraz.
Dois mil e treze ensinou-me a acreditar no imponderável, a relativizar o razoável, a
respeitar o inflamável, a apostar no improvável, sem querer provar nada, para ser
capaz de saborear o admirável.
Abracadabra é a palavra que dedico a 2013. A magia sutil esteve e ainda está no ar,
na terra e no mar de possibilidades, tão reais quanto nós e nossa infinita capacidade de desatar todos os nós.
Acreditem, somos sóis e é somente por isso que nunca fomos e nunca seremos sós.
Meu abraço, longo e sentido, a este ano que rejuvenesceu meu olhar, que fez de cada
singular momento o meu lar.
A todos vocês, meus votos de que 2014 seja um ano campeão, generoso em conquistas, dessas que duram mais que noventa minutos.
Meus votos de que nossos votos sejam capazes de eleger sonhos que não se convertam em pesadelos, pela compreensão de que é o sonhador quem interpreta e realiza seus próprios sonhos.
Que principie a construção de um mundo sem príncipes avassaladores e sem vassalos, em que haja mais Deus que deuses. Um mundo em que não se compre tudo e no qual exista mais compreensão.

sábado, 21 de dezembro de 2013

felicidade clonada

Felicidade, no passado, era um estado de alma, um estar em calma que alcançava territórios imensos, antes de tocar o corpo. Tratava-se de algo que acometia todos os mortais, como se fosse uma chuva torrencial penetrando os orifícios da terra, um soberbo ofício que anjos praticavam generosamente, em prol dos humanos.
Contemporaneamente, felicidade deixou de ser presença, para se transformar em ausências: de angústia, de ansiedade, de frustração. Criou-se a felicidade química, anunciada em receituários e vendida nas melhores lojas do ramo.
Assim sendo, há advertências na bula, efeitos colaterais, dentre eles a perda da possibilidade de ficar triste. Que tristeza! Felizes o tempo todo, a toque de caixa (após passar no caixa das drogarias), somos cobaias de nossos medos, presas muito fáceis para fantasmas recorrentes, que já nem precisam mais de correntes para nos assustar. Mas integramos a bizarra corrente dos contentes, Polianas pós-modernas, a ostentar sorrisos clonados. Quem sabe, um dia, tenhamos acesso aos sorrisos siliconados.
Felicidade por decreto é o caminho mais reto e, portanto, mais curto para promover um curto-circuito em nossas emoções, deixando-as a mercê da indústria da superficialidade, do prazer tirânico e banalizado, com que nos conformamos em buscar cega, tola e avidamente.
Reivindico o direito de não estar sempre nas nuvens, como único caminho válido para suportar a felicidade que incide naturalmente sobre nós e coincide com o que há de mais autêntico em nossos corações.

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

o fu(tu)ro

No presente há um pequeno furo

por onde passa, de gota em gota,


todo o futuro.

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

viu?

Sejamos capazes 
de perceber a beleza sutil
Que não nos doa
doar o que já nos serviu
Pois o que atordoa
é alimentar o medo servil
Fundamental
é apenas ser, viu?

de mim

Há sentimentos que, de tão gigantescos, mal cabem no peito. Uma parte deles escorrega do coração e chega às mãos, aos braços, aos olhos, aos dedos que
tateiam, em busca das emissárias mais precisas, que possam traduzir um pouco
dessa multidão de emoções que se acotovelam no território encantado do lado
esquerdo da gente. 
Há sentimentos que chegam a doer, de tão vivos. Eles falam o idioma único do
bem querer incondicional. Tais "querências" exalam o aroma das estrelas, das luas, dos sóis, de tudo quanto é mais autêntico, inconfundível e eternamente eterno.

aos que amo


A vocês, que abrem meus olhos e entregam a eles as maravilhas da paz
A vocês, que fecham meus olhos e me permitem ver-me tão melhor
A vocês, que colorem minha vida, como mais ninguém faz
A vocês, cujas essências eu reconheço e recito de cor

A vocês, eu dedico todas as manhãs e os amanhãs
A vocês, que dão sentido às minhas utopias vãs
A vocês, tudo do pouco que eu juntei
A vocês, que significam tudo que eu mais amei

preferencial

Vamos sair por aí, sem medo de não chegar.
Sem destino, sem tino, com o repentino prazer de voar.
Vamos sair pela frente, sem disfarces, exibindo todas as faces da irreverência.
Íntimos dos becos, dos ecos que às nossas mais deliciosas travessuras dão sempre preferência.

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

seda

Eu quero que a chuva caia
e que ela me atraia
até me inundar
Eu quero que o raio parta
para muito longe,
sem querer voltar
Eu quero que o tempo se arraste
e mesmo que não baste,
vou aproveitar
Pois sei que tudo é imensamente frágil
e o pensamento é ágil
para imaginar
E por falar em imensidão,
o meu coração não quer se lotear
Eu olho em toda a direção
e só encontro um ponto sem desapontar
Por todos os meus descaminhos,
enfrentei moinhos
sem os derrotar
Espero que a noite ceda
e a madrugada, feito seda,
possa te enfeitar.

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

compreensão

Eu me maravilho com o oceano.
Mesmo sabendo que ele guarda afogamentos,
naufrágios, marés, correntezas, perigos.
Por que eu não seria capaz de amar pessoas?
Eu me deslumbro com a noite.
A despeito da escuridão, das sombras,
dos medos imaginários e reais.
Por que eu não seria capaz de me amar?

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

locatários

Há coisas que não se explicam. O amor e a dor que sentimos, as manias, as superstições, as intuições. Tudo isso desenha ângulos de nossas almas, o que somos em águas rasas e nas mais profundas. Para que tentar explicar? Poucos entenderiam ou tenderiam a fingir que entendem, só para agradar. Acariciemos nossos avessos, que eles se tornem tão travessos que provoquem boas risadas. Abracemos tudo que reside em nós, nossos insólitos locatários, ao menos uma vez. Sem qualquer critério nem exaustivas racionalizações. Afinal, estamos a passeio e as férias só começaram.

no mesmo lugar

Eu irei lá.
Não por fotografias ou pela grafia da ilusão.
Irei pelas próprias pernas, que se farão quase asas, que serão como casas,
para me salvar das distâncias e das ânsias que brotam de cada escuridão.
Eu irei lá.
Mas sem levar aqui na mochila.
Tentarei estar vazio do que fui e aberto ao que flui, para que isso me encha sem
transbordar, bordando em mim leitos de rio em que poderei repousar.
Eu irei lá.
Livre de mapas e roteiros.
O próprio caminho será como um mosteiro sem paredes, o meu teto e o meu
chão.
Quando chegar lá,
não olharei para trás nem para a frente.
Terei encontrado, finalmente, o princípio e o fim juntos, no mesmo lugar.