segunda-feira, 28 de julho de 2014

que nada

Talvez para mim o mundo não tivesse jeito
Talvez o súbito abismo, de tão fundo,
nem coubesse no meu peito
Talvez eu aceitasse as regras
de um jogo muito sem graça
Talvez eu até me tornasse indiferente
ao que mal chega e já passa
Talvez eu abandonasse meu time,
depois de um caminhão de derrotas
Talvez eu acreditasse que as exclusões
seriam abolidas por cotas
Talvez eu renunciasse às escolhas
e escolhesse a mais silenciosa abstenção
Talvez eu anunciasse no meio da rua
que só caminharia na contramão
Talvez minha voz cedesse sua vez
àquelas que fazem tanto barulho
Talvez eu pudesse decorar tantas teorias vazias
até transformar minha mente num estranho entulho
Talvez eu me acostumasse com direitos elementares
enterrados em cova rasa
Talvez minha indignação nem se iluminasse
com tanta escuridão na faixa de Gaza
Talvez eu sentisse conforto no ceticismo
e me escondesse na solidão
Talvez eu distraísse minhas angústias
com circo e pão
Mas nada disso eu consigo,
pois uma chama misteriosa me diz "que nada"
e permanece comigo.

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