quinta-feira, 13 de maio de 2010

prova de amor e a efemeridade das coisas

Vi o filme com os olhos hidratados. Afinal, é muita emoção, com situações limítrofes,
em que vida e morte trafegam paralelas. A angústia das perdas, do que cessa,
sem nos consultar, da aflição de sentir escorrer o que parece (parece) ser tudo que temos.
Ao sair do cinema, pus-me a refletir: ora, a manhã linda de qualquer dia, mes e ano nunca
mais acontecerá e, nem por isso, nossos corações apertam-se, por essa irrecorrível passagem. Nunca mais teremos a idade que já tivemos, nunca mais jogaremos aquela partida (ainda que outras se sucedam), o sanduíche delicioso que provamos e arrebatou o paladar não se repetirá, ainda que tantos outros sejam saboreados. Os amigos e amigas com quem convivemos, atualmente, crescem, modificam-se, mudam (de endereço, de perspectivas, de estado civil, têm filhos, trocam de profissão...). Portanto, eles não serão, mais, os mesmos.
Todas as noites morrem no amanhecer, todo os Sóis se põem e, ainda que voltem a despontar no horizonte, será outro Sol, diferente dos demais. Os caminhos que percorremos, diariamente, renovam-se, de acordo com nossa percepção, atenção, estado de espírito. Nós trocamos de pele, constantemente e a pele é o nosso maior órgão, assim, também nós deixamos de ser, fisicamente, o que fomos, embora não percebamos as metamorfoses.
Variamos de projetos, de prioridades, há sonhos que rejuvenscem, outros que se escondem em guardanapos, espelhos, troncos de árvores, palmas das mãos, bilhetes enrugados.
Em suma, a vida coleciona despedidas e, concomitantemente, nascimentos,
surpresas, novidades.
Há porvir por toda a parte, a prover olhares novos, sonhos novos, esperanças nascituras, fantasias que engatinham, em busca da realidade que as adote e as torne adultas.
Assim é a existência - coisas que acontecem, crescem, transformam-se, para que outras cheguem, ocupem seu espaço, floresçam, em moto contínuo. Aí repousa a beleza de ser,
o encanto que surpreende, pela renovação e pela impossibilidade de encarceramento.
Vida é liberdade, é movimento, é o rio que, somente na aparência, é sempre o mesmo.
Portanto, a maior prova de amor à vida é viver, boquiabertos por tudo que esse processo maravilhoso é capaz de nos oferecer. Ele traz, ele leva, releva e nos sorri, infinitamente, pois infinita e imortal é a nossa paixão de estar aqui, com todas as incertezas que nos impelem a prosseguir, a criar, a sorrir, a chorar, a catar desejos, em nós mesmos, a cantar para que nossos temores adormeçam e tenham dias e noites serenos.

5 comentários:

  1. ...a cantar para que nossos temores adormeçam e tenham dias e noites serenos.

    Gostei muito.

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  2. Que os temores jamais fiquem insones, que a serenidade amanheça e anoiteça em nós...

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  3. Sabe que deu vontade de ler seu blog, mas o inicio dele?
    O inicio, em que eu infelizmente não estava.
    Que texto profundo.
    Helcio...eu amo tanto a vida...
    Mesmo com o pacote que ela nos traz.
    Dores, alegrias, perdas, ganhos...
    Idas e vindas..
    As vezes a vida passa, e a gente não.
    Eu preciso aprender tanto a andar com ela.

    Um abraço!
    (E continuo lendo)

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  4. Voltei, como prometido.Deixei um comentário logo cedo e fui caminhar, voltei ao blog, que se tornou a vírgula do meu dia.
    Nota 10 para o texto acima.

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  5. Angela, li, saboreei e teci um breve comentário ao teu. Sua presença ilumina este espaço.

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